maio 28, 2007

Pura Magia

Mais um excerto de um dos meus textos, que já tem uns aninhos...


Evelyn subia a custo a encosta sul da montanha. Sabia que algures nas grutas viradas a norte encontraria o seu velho amigo Drake.
Drake era apenas alguns anos mais velho, no entanto, optara por refugiar-se na montanha para se concentrar única e exclusivamente na aprendizagem dos ramos mais altos da magia, queria tornar-se num verdadeiro mago. Há já cerca de cinco anos que Evelyn não o via, lembrava-se de como costumavam andar sempre juntos, partilhar segredos, passear nas longas tardes de verão, contudo, sabia que os olhos cinzentos do seu amigo escondiam algo, um segredo que não havia sido partilhado com ninguém, nem mesmo com ela – a sua melhor amiga.
O sol já descrevera grande parte do seu ciclo, encontrando-se relativamente perto da linha do horizonte, o céu apresentava tons rosa e laranja, a brisa soprava morna, vinda de Este. A caminhada era longa, mas Evelyn estava decidida e nada no mundo a faria mudar de ideias. Por fim avistou as reentrâncias no cimo da montanha, ele havia de estar numa das grutas, restava saber em qual.
A luminosidade era cada vez mais fraca, do sol já pouco ou nada se via, as grutas eram húmidas e escuras. Uma a uma, cada reentrância foi alvo dos olhos curiosos da rapariga, até que numa delas, Evelyn viu uns olhos estranhos que a fixavam e sentiu também um bafo quente. Não conseguiu ter qualquer reacção, as suas pernas tremiam, o seu coração parecia querer saltar-lhe do peito, a cabeça andou à roda e perdeu os sentidos.
Ao reabrir os olhos sentiu-se dorida, estava deitada numa cama de ervas e coberta por uma pele de urso. A visão ainda se encontrava algo desfocada; passou as mãos pelos olhos para a aclarar, quando as retirou viu a figura de um homem que lhe sorria e lhe estendia uma chávena de qualquer coisa fumegante.
- Há quando tempo, Evy! Estavas com melhor aspecto da última vez que te vi! – proferiu em tom jocoso. – Que te trás por cá?
A rapariga apercebeu-se que o homem que se encontrava sentado ao seu lado era nem mais nem menos que Drake, o seu amigo. Estava diferente, mais velho – não apenas pelos cinco anos que tinham passado… as suas feições permaneciam agradáveis, mas estavam mais duras, tinha um ar mais adulto, mais maduro. Sem dar por isso, Evelyn corou ao olhar para Drake. A última vez que o tinha visto era apenas um rapaz, agora tornara-se num homem charmoso e misterioso.
- Quero aprender magia! – disse.
- Evy, estás cansada. Da aldeia até aqui ainda é longe. Levaste um grande susto… Acabaste de recuperar os sentidos.
- Quero aprender magia, Drake! Não percorri todo este caminho para me tentares dissuadir! Sei o que quero e se não for contigo, que és o meu melhor amigo, há-de ser com outro mestre que me aceite! – E dito isto, cruzou os braços em frente do peito.
- Evy, porquê magia? Porquê eu? Porquê agora?
- Para quem se tornou mago, já devias ter calculado a resposta… – retorquiu, olhando-o de lado. – Pois bem, porquê magia, há muito que queria aprender. Desde os tempos em que me falavas de tudo o que esperavas tornar-te, o que tinhas de estudar… Porquê tu?, porque és o meu melhor amigo e sinto que me podes iniciar. Porquê agora?, foi como que um chamamento… Algo me disse que tinha de vir.
- Tu sabes o que viste quando aqui chegaste? – Ao perguntar, Drake desviou o olhar da rapariga, acto que chamou a sua atenção.
- Apenas uns olhos estranhos… senti também um bafo quente… – Reparava agora que os olhos cinzentos do seu amigo estavam mais misteriosos que antes, sabia que ele lhe ia contar algo de que ela não ia gostar, muito provavelmente.
- Era um dragão Evy. Eu sou um dragão.
A primeira reacção de Evelyn teria sido rir-se caso o ar triste e sério de Drake não a tivesse levado a acreditar no que acabava de dizer.


(...)

Por fim chegaram à clareira, tudo era paz e tranquilidade naquele espaço. Não muito longe corria o rio, o murmurar das suas águas puras e cristalinas fazia-se ouvir como uma doce melodia numa tarde de final de primavera. Evelyn tratou de colocar cada objecto no seu devido local e refugiou-se atrás de um grande carvalho para mudar de roupa. Drake, por sua vez, foi até ao rio, encher de água uma pequena taça de prata. Quando voltou já ela se encontrava no centro do círculo formado pelos objectos rituais. Os seus olhos brilharam ao vê-la ali, de cabelos soltos, embalados pela brisa da tarde, vestindo apenas uma túnica comprida de tons azuis, empunhando uma pequena faca de lâmina retorcida. Colocou a taça no seu lugar e ficou sentado numa raiz saliente a observar a sua aluna a desempenhar parte do que lhe fora ensinado. O ritual demorou algum tempo, a lua já aparecia no céu, a brisa continuava morna, Evelyn agradecia agora a presença dos elementos, do Deus e da Deusa. Drake parecia estar em transe, algo mais aparecera naquele momento mágico… o espírito do seu mestre.
«Diz-lhe, não cometas o mesmo erro que tantos de nós cometemos. Agarra esta oportunidade porque outra não se te apresentará!»


por: Milene Emídio

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